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Brasil sob fogo cruzado: o embate entre o governo e o Banco Central

*Por César Piorski

Próximo a completar 90 dias, o novo governo ainda não acertou o passo de maneira a indicar para qual rumo seguiremos doravante. Enquanto isso não ocorre, incertezas e especulações povoam nosso imaginário. O aguardado arcabouço fiscal ficou para depois, não ficando claro se por prudência ou por resistência, por isso, na falta de sinais claros, somos obrigados a conjecturar sob o que nos aguarda.

A julgar pelos nomes influentes que compõem a equipe econômica do atual governo, não seria fantasioso inferir que a política econômica pretendida será de influência pós-keynesiana (uma escola de pensamento econômico que, a grosso modo, entende os problemas da economia a partir da insuficiência de demanda efetiva num contexto de incerteza).

Para esta escola, em cenários de alto endividamento público, alta inflação e elevado desemprego, que é o cenário atual da economia brasileira, a política econômica mais adequada seria aquela capaz de promover a estabilização da economia a partir da redução da inflação, promoção do emprego e redução das desigualdades sociais, o que poderia ser alcançado a partir de uma política monetária expansionista, isto é, o governo passaria a “imprimir” mais dinheiro tanto de maneira direta, como de maneira indireta, a partir do aumento dos gastos públicos.

O estímulo imediato da economia ocorreria a partir da política fiscal, por meio do aumento dos gastos públicos em áreas prioritárias como infraestrutura, saúde e educação, que geram empregos e aumentam a demanda agregada, o que permitiria reduzir ainda mais a taxa de desemprego e, de maneira indireta, poderia estimular o investimento privado na economia, gerando um ciclo virtuoso de geração de emprego e renda.

Neste contexto, o aumento do gasto público não seria um problema, dado que a relação entre dívida e produto interno bruto (PIB), que é aquela que o mercado calcula à risca e contribui para formar suas expectativas, seria naturalmente diminuída, dado que o denominador, neste caso o PIB, passaria a crescer a taxas maiores que o numerador (neste caso a dívida), para além do crescimento econômico. A sustentabilidade da dívida também seria alcançada a partir da redução das taxas de juros e controle inflacionário.

No que diz respeito ao controle inflacionário, pode causar estranheza ou até mesmo parecer contraditório o fato de que a expansão monetária contribuiria para derrubar a inflação e não acirrar. Ocorre que, para esta escola de pensamento, a inflação é um fenômeno influenciado por diversos fatores como a elevada demanda agregada, custos de produção, estrutura de mercado, distribuição de renda, entre outros. Assim, o determinante da inflação não seria a quantidade de moeda, mas sim o nível de demanda efetiva, a qual, a julgar pela fraqueza da atividade econômica, parece não ser o caso da economia brasileira.

Por sua vez, a redução das desigualdades sociais poderia ser alcançada a partir de políticas redistributivas como a tributação progressiva, programas de transferência de renda e alguma ou outra regulação sobre a geração desta. Isso permitiria atacar a concentração de renda e estimular o consumo, contribuindo para a estabilização da economia.

Curiosamente, os efeitos desta provável política econômica ressoariam no mercado financeiro induzindo os agentes a uma recomposição (ou balanceamento) dos seus portfolios. Neste caso, tudo dependerá da prioridade estabelecida pelo governo, pois caso a política monetária adotada visar a redução da taxa de juros de longo prazo e o aumento do crédito para investimentos produtivos, isso beneficiaria as ações de empresas do setor produtivo e debêntures de baixo risco.

Por outro lado, se a política monetária adotada visar a redução da inflação e o aumento da confiança no mercado, os ativos financeiros beneficiados seriam aqueles com menor risco de perda de valor em um contexto de alta inflação, como os títulos públicos indexados à inflação e os fundos imobiliários menos sensíveis à variação da inflação.

O grande problema que se estabelece e que está a acentuar o aumento da volatilidade nos mercados, desconfianças quanto ao atual governo e pessimismo quanto ao futuro da economia brasileira, consiste no fato de que a chave para a implantação desta provável política econômica depende substancialmente da política monetária, que está sob tutela do Banco Central, agora independente.

O Banco Central, por sua vez, entende o funcionamento da economia sob um prisma diametralmente oposto, de maneira que, na ausência de consenso entre ambas as partes, continuaremos sob fogo cruzado, cujas rajadas estão a abater impiedosamente empregos e negócios.

*César Piorski é Doutor, Mestre e Bacharel em economia com especializações em Economia de Empresas, Engenharia Financeira e Macrocenários. Atua como estrategista da Volk Capital, empresa que fundou em 2022.

Por: Oficina da Comunicação

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