Caminhos da Influência em Uma Negociação

Caminhos da Influência em Uma Negociação

Negociação é um processo de comunicação; ou seja, trata-se de um processo de interação social que envolve duas ou mais pessoas a respeito de seus interesses, identidades e cognição, dedicadas ao alcance de um acordo sobre a substância negociada através de ganhos mútuos

Por Julio Cesar S. Santos

O processo decisório e, consequentemente, a negociação são impactados pelas respostas que são automáticas. Assim, operadores do direito e negociadores devem se preocupar com o modo pelo qual o ser humano processa uma mensagem e toma decisões. Segundo Guthrie, a heurística seriam os atalhos mentais que as pessoas empregam automaticamente para fazer julgamentos e decisões. A heurística é, portanto, o processo pelo qual o ser humano facilita a tomada de decisões, simplificando-a, de maneira automática e involuntária. Para Cialdini, comportamentos automáticos são predominantes na ação humana, além de serem eficientes e necessários, já que seria inviável tomar decisões conscientemente achado fato cotidiano.

Dessa forma, não se pode esperar que reconheçamos e analisemos todos os aspectos de cada pessoa, evento e situação que encontramos num mesmo dia.  Nós não temos tempo, energia ou capacidade para isso.  Em vez disso, devemos muito frequentemente usar nossos estereótipos, nossas regras de ouro para classificar coisas de acordo com algumas características-chave e, em seguida, responder sem pensar quando um ou outro desses atalhos estiver presente. É notório que nem todas as decisões podem ser tomadas de forma automática, uma vez que algumas exigem maior análise e reflexão.  Às vezes, os atalhos e respostas automáticas serão imperfeitos para determinadas situações, em que se deve pensar além dos preconceitos e do que é previsível.

Rotas de Influência

Para Lewicki, a influência pode ser definida como o conjunto de “estratégias e mensagens reais que os indivíduos implementam para trazer mudanças de atitude e comportamento”. Durante muito tempo, os psicólogos entenderam que a influência eficaz ocorria quando o remetente recebia, prestava atenção, entendia e aceitava o conteúdo de determinada mensagem. No entanto, pesquisas mais recentes demonstraram que pode haver mudança de atitudes e comportamentos sem que se entenda ou se retenha as informações específicas da mensagem. Quer dizer, percebeu-se que as pessoas podem ser influenciadas sem que sequer tenham prestado atenção. Isso significa que a influência não se dá apenas por meio conteúdo da mensagem. Lewicki entende que há dois caminhos pelos quais ocorre a persuasão: a rota central e a rota periférica; assim, essas duas grandes categorias devem ser exploradas na negociação.

Embora as pessoas tenham diferentes capacidades persuasivas, todos podem melhorar suas habilidades através de ferramentas de influência e uma comunicação efetiva é importante não só para que se chegue a um acordo, mas para que a outra parte seja persuadida a negociar e buscar opções de ganho mútuo. Stanchi entende que o nível de envolvimento, quer dizer, de relevância atribuída pelo público-alvo da mensagem persuasiva, é um fator importante para a influência, pois possibilita que os destinatários conectem a mensagem a crenças e valores pessoais, de modo que está intrinsecamente relacionado ao processo de tomada de decisão. O envolvimento, por sua vez, associa-se diretamente às duas (2) rotas de influência de Lewicki, que podem ser assim descritas:

Rota Central: A preocupação é com o conteúdo da mensagem (como torna-la atrativa e estruturada)

Rota Periférica: Quanto ao resultado, o comprometimento é interno, mais duradouro e resistente. Preocupa-se com as distrações formato e ordem das mensagens. O compromisso é simples, relativamente curto e com maior risco de sofrer influências contrárias.

Para Stanchi, as rotas de influência diferenciam-se pela profundidade com que os destinatários consideram o tema e a mensagem. Ainda: a rota do processamento central é caracterizada pela avaliação cuidadosa e crítica dos méritos, dos argumentos. Durante o processamento da rota central, o destinatário da mensagem se envolve ativamente com a mensagem persuasiva, gerando seus próprios pensamentos e argumentos em resposta à informação que ele tem recebido.  O processamento da rota periférica, por outro lado, é menos pensativo e engajado, e é muitas vezes baseado na heurística ou em atalhos não relacionados ao mérito da mensagem. Lewicki aponta estratégias para que o negociador exerça uma influência eficaz na rota central. Em relação ao conteúdo, indica-se (a) transformar a oferta em algo atrativo para a outra parte, por meio do conhecimento das necessidades das suas necessidades e da antecipação do não; (b) estruturar a mensagem para que o destinatário diga sim, encontrando um ponto pacífico e partindo daí; (c) tornar a mensagem normativa, demonstrando que o acordo é nobre, moral e ético; (d) sugerir um acordo logo no início.

No tocante à estrutura, deve-se (1) ter uma abordagem bilateral, descrevendo o ponto de  vista  oposto  e  demonstrando  porque  ele  é  menos  desejável,  uma  vez  que  é  mais vantajoso expor os contra-argumentos que deixar para a outra parte fazê-lo; (2) quebrar os argumentos  complexos  em  partes  menores  e  mais  compreensíveis,  que,  de  preferência, contenham  declarações  com  as  quais  o  outro  negociador  concorda;  (iii)  utilizar-se de repetições, pois aumenta a chance de a mensagem ser ouvida e entendida; (iv) deixar o destinatário alcançar a conclusão desejada pelo emissor da mensagem, por si só, exceto nos casos em que, aparentemente, ambos não chegarão à mesma conclusão. Por  fim, quanto  à  emissão  da  mensagem,  recomenda-se  (i)  o  encorajamento  da participação ativa, que gera mais envolvimento e, assim, maior mudança de atitude; (ii) o uso  moderado  da  linguagem  intensa,  que  pode  ser  utilizada  para  demonstrar  um  ponto importante e das metáforas e analogias, as quais ficam reservadas às situações em que faz-se  necessário  resumir  fatos  ou  criar  uma  impressão  visual;  (iii)  a  não  utilização  de ameaças -declarações  serias  com  consequências  negativas,  pois  geralmente  não  são efetivas; (iv) a quebra das expectativas do destinatário, que tendem a ser mais persuadidos por argumentos que não esperavam. Portanto, na rota central, o conteúdo, a estrutura e a emissão da mensagem se bem trabalhados aumentam a efetividade e persuasão da negociação, uma vez que propiciam maior mudança de atitude da outra parte, bem como a maior duração do acordo e de resistência às influencias contrarias. Por sua vez, utiliza-se a rota periférica quando o receptor não está prestando atenção no conteúdo, e aí poderá ser influenciado pelos atributos da pessoa que transmite a mensagem e pelo modo como a mensagem foi expressa.

Assim, a credibilidade do negociador; sua reputação em relação à confiabilidade e integridade; a maneira como se apresenta e se comunica; as primeiras impressões; as diferenças de status; sua persistência e determinação e a habilidade de não deixar transparecer a intenção de persuadir são características que exercem influência sobre o destinatário na rota periférica. Ademais, no que se refere à manifestação da mensagem, Lewicki recomenda que o negociador busque elevar sua atratividade, já que ser agradável tende a apaziguar o destinatário.  Sugere-se, portanto, que procure ser simpático e extrovertido, em vez de iniciar a negociação de forma direta; que faça elogios, auxilie o destinatário, perceba coisas em comum, modere a utilização das emoções como ferramenta de persuasão e que demonstre autoridade. O negociador deve preocupar-se em aumentar sua influência sobre o envolvimento da outra parte. É possível mover o destinatário para mais perto da rota central ou afastá-lo dela, por meio da rota periférica, e embora advogados já busquem influenciar o nível de preocupação que o destinatário atribui ao problema, frequentemente não sabem como funciona a psicologia do processo decisório e quais estratégias utilizar para afetá-lo.

REFERÊNCIAS

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